O trabalho do editor
Marcelo Ferroni, do Grupo Companhia das Letras, inaugura série de entrevistas Como se faz um livro
O editor é como um maestro no processo de edição de um livro. Ele coordena as várias etapas – revisão ortográfica, preparação de originais, elaboração da capa e projeto gráfico, entre outras – e mantém contato com o(a) autor(a), principal cliente da editora. Não apenas isso. É o editor ou editora quem lê e elege os originais a serem levados em consideração para publicação – lembrando que, em uma grande casa editorial, a decisão final depende de aprovação em várias instâncias.
Oasys Cultural convidou Marcelo Ferroni – editor dos selos Alfaguara, Objetiva e Suma no Grupo Companhia das Letras para contar como funciona seu trabalho. Ele nasceu em junho de 1974, em São Paulo, e vive atualmente no Rio de Janeiro. Como autor – sim, ele também é escritor! – , publicou “Método prático da guerrilha” (2010) — vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura, categoria Romance de Estreia —, “As maiores novidades: a viagem no tempo” (2021), e “A febre” (2023). Leiam a entrevista com Marcelo.
Há quanto tempo você é editor do selo Alfaguara e como conquistou esse lugar?
Marcelo Ferroni: Comecei na Alfaguara alguns meses depois de o selo ser lançado no Brasil, em 2006. A Editora Objetiva precisava de um editor que cuidasse só do selo, e fui entrevistado em outubro, se não me engano. Assumi o cargo em novembro (logo mais completo 18 anos trabalhando nele). Antes, eu havia sido editor na Globo, e um conhecido em comum me indicou para o cargo.
Como é seu trabalho no dia-a-dia?
M: Hoje eu coordeno mais dois selos além da Alfaguara: Objetiva (não ficção prática) e Suma (ficção especulativa). Na Alfaguara, temos um trabalho compartilhado entre a Fernanda Dias, eu, a Daniela Duarte e a Juliana Boas. Na Alfaguara, tenho me debruçado, nesse momento, quase que exclusivamente na edição de autores nacionais. Então é um mergulho nos textos, num processo que envolve muito a conversa e a troca com os autores.
Quais são as etapas de produção de um livro, resumidamente?
M: No caso de um autor nacional, o processo passa pela contratação do original e, a seguir, no trabalho com o manuscrito, o que às vezes pode levar bastante tempo. Uma vez terminado o processo, o livro passa por uma preparação, depois a diagramação e três revisões, antes de ir para a gráfica. Em paralelo, a editora começa a trabalhar na capa, nos textos de apoio e, geralmente, começa a pensar no planejamento de marketing. O autor é consultado em diversos momentos nesse processo.
Os editores, hoje, têm tempo de ler livros inteiros e debatê-los com os autores, sugerir mudanças e ajustes, como faziam antigamente?
M: A nossa ideia, na Alfaguara, é justamente essa. Trabalhar com muita intensidade junto com a autora ou autor, para conseguir que o manuscrito chegue ao seu potencial máximo. Geralmente fazemos, inclusive, mais de uma leitura, nos revezando entre as editoras e eu. E temos muitas conversas no processo.
Editores se destacam pelo “faro” para prospectar novos livros e autores com potencial de sucesso, como aconteceu com “Mata doce”, de Luciany Aparecida, e “Gótico nordestino”, de Cristhiano Aguiar. Como é possível desenvolver este dom?
M: Acredito que o editor adquire esse “faro” na prática: com muita experiência e muita leitura. Muitas vezes, o manuscrito inicial pode ainda ser um rascunho; às vezes, não está nem finalizado (já chegamos a contratar um romance com apenas 15 páginas de texto). É preciso, então, entender o que o manuscrito revela, e até onde ele poderia ir. A gente também tem uma conversa prévia com a autora ou autor. Essa conversa é importante para entender se conseguiríamos estabelecer uma relação de confiança. Tudo isso a gente vai pegando na prática.
O que é necessário saber ou estudar para se tornar editor?
M: O necessário é ter um volume enorme de leituras. E a leitura tem de ser ampla, não focada. Para ser um editor literário, não adianta ler somente autores contemporâneos, mas se interessar por diferentes períodos, ler os clássicos, tanto brasileiros e estrangeiros, enfim, é preciso ser um pouco obsessivo.
A edição literária passa também pela escrita, ou seja, o editor vai acabar se envolvendo na estrutura do livro, de modo a entender e sugerir alterações. Quanto maior o domínio da escrita, melhor, para saber o que dá para sugerir, ou o que sairia muito da narrativa.
Como é o mercado de trabalho para editores no Brasil?
M: É um mercado bem pequeno, mas aberto. A literatura brasileira passa por um ótimo momento, e isso faz com que as editoras olhem o setor com mais interesse, e façam mais contratações. Para trabalhar com os autores, elas irão precisar de editores. E hoje a gente vê várias editoras novas surgindo, e muitas delas lidando com literatura contemporânea, ou seja, é necessário ter um editor aí, para conduzir o trabalho com o texto e os autores.
Quais são as diferenças entre ser editor em uma grande editora e em uma casa independente?
M: Numa editora grande, os editores trabalham principalmente com o texto inicial. Depois de fechar o manuscrito, e no momento da preparação, o livro é assumido por outros departamentos. O editor continua atuante, mas geralmente ele entra só para tirar dúvidas de revisão, e trabalhar com o autor no processo de capa, aparatos, textos de cadastro etc. Numa editora pequena, o editor geralmente tem de fazer todo o processo, da contratação à impressão, passando por vendas e marketing, o que é muito mais trabalhoso.
Prêmio São Paulo de Literatura abre inscrições
A partir do dia 3 de junho até 23 de julho de 2024 estarão abertas as inscrições – gratuitas – para o Prêmio São Paulo de Literatura 2024. Escritores e editoras podem inscrever romances em duas categorias: “Melhor Romance do Ano de 2023” e “Melhor Romance de Estreia do Ano de 2023”. O valor bruto do prêmio é de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para o(a) vencedor(a) de cada uma das categorias. A vencedora de Melhor Romance 2022 foi Mariana Salomão Carrara, cujo romance “Se deus me chamar não vou” (Ed. Nós), foi lido em Leituras no Oasys, o clube de leitura da Oasys Cultural. Leia aqui o edital.
Prêmio Biblioteca Nacional abre inscrições
Em seu aniversário de 30 anos, o Prêmio Literário Biblioteca Nacional abre inscrições para escritores com nacionalidade brasileira, cujas obras em 1ª edição tenham sido redigidas em língua portuguesa e publicadas por editoras nacionais, entre 1º de maio de 2023 e 30 de abril de 2024. As inscrições são gratuitas e o valor da premiação é R$ 30 mil reais cada uma das doze categorias. As novidades da edição 2024 são as categorias Ilustração (Prêmio Carybé) e Histórias em Quadrinhos (Prêmio Adolfo Aizen). Prazo: 11 de julho. Informações aqui.
Percalços do mercado editorial brasileiro
A divulgação da Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro – Ano Base 2023, divulgada em 22 de maio, deu um chacoalhão no nosso mercado por causa da complexidade dos desafios expostos e por revelar que as vendas de livros e o faturamento das empresas está em queda. Um dos problemas é que, como se não bastasse a competição desleal da Amazon, que faz promoções impossíveis para livrarias físicas – que pagam aluguel etc –, as editoras também estão vendendo livros direto ao consumidor, através de seus sites, e assim, também competem com as livrarias. Recomendamos a leitura da reportagem completa no PublishNews, o portal de notícias do mercado editorial.
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Até a próxima!
Com carinho,
Valéria Martins | Agente Literária da Oasys Cultural
Adorei essa entrevista com meu prezado editor, que além de tudo é excelente autor de ficção também.
Excelente trazerem mais um profissional do mercado para dar entrevista, a ideia de mercado editorial vai ficando mais concreta